Echo, echo, echo(...)

sábado, 30 de julho de 2011

Sete Dias de Sol Fraco.

Aconteceu, num passado não muito distante, de o amante ter-me dito que tinha um affair de um ano, mais ou menos, com sua primeira namorada, pela qual ele havia sido muito apaixonado. Ela morava em Manaus, muito longe de nós dois, então ela não representava uma ameaça para mim. Na verdade era como se ela nem existisse realmente, até o fatídico dia em que Samir me avisou que ela estava vindo vê-lo. Eu perguntei quantos dias ela ficaria, ele respondeu que um final de semana. Carência, mistura de sentimentos, respostas para perguntas que eu não tinha, perdição, danação, sensação de afogamento.

Dois dias depois, o amante me disse que “ela” havia ligado pouco antes da viagem e que eles tinham discutido, portanto ela iria cancelar a viagem. Eu disse para ele que se ela fosse esperta, como eu achava que era, ela não só viria, como acabaria conosco. Ele disse: “Lá vem a senhorita engolindo corda!” Pior que eu sabia que se ela viesse ele teria de dar atenção para ela, afinal de contas ela estava vindo de longe só para vê-lo e além do mais ela era a namorada original. Desconfiança, egoísmo, confusão, ciclo de confusão, nervosismo e indecência.
No dia seguinte fomos dar uma volta de bicicleta e paramos num bar para tomar duas cervejas, que logo se transformaram em oito. Conversamos muito e rimos muito. Samir estava encantador dizendo coisas tais quais: “Para mim vai ser muito triste se um dia eu não puder tê-la.” ou “Eu tenho um carinho enorme por você. Não quero perdê-la nunca.”
Voltamos para casa já tarde da noite, eu mal conseguia guiar a bike de tão cansada que eu estava, e ele lá, todo doce e preocupado com meu bem estar. Sensação de poder, sensação de poder tudo, sensação de ser, sensação de ser tudo.
No dia seguinte eu tinha de dar uma aula. Depois da aula eu decidi passar na casa dos pais de Samir para pegar minhas coisas que haviam ficado lá. Chamei duas vezes e ouvi uma voz respondendo que ele estava tomando banho, então eu esperei um pouco do lado de fora quando de repente a garota de Manaus apareceu à porta. Eu congelei no mesmo momento em que pensava “Puta que pariu!” Eu sabia que era ela, pois ele havia mostrado umas fotos dela para mim um dia – como se eu tivesse querido vê-las. Chão se abrindo, céu desabando, rosto estático.

Ele saiu lá de dentro e ficou do lado de fora conversando comigo durante 15 minutos ou mais, numa gentileza de comover, como se fossemos melhores amigos, pois, antes de tudo, era isso que eramos: amigos. Falamos sobre minha irmã, sobre minha mãe, sobre coisas superficiais, ele perguntou para onde eu estava indo, disse-me que queria andar de bike mas que naquele momento não ia dar, pois tinha “visita” e depois despediu-se de mim dizendo que me entregaria minhas coisas num outro dia. O fato de ele haver conversado comigo tranquilamente diminuiu meu nervosismo. Fui para casa triste, mas convencida de que eu era mais que um recreio para ele. Qualidade de poder, ser, estar, vento no rosto, mais vento, vento forte de agosto e sensação de escolha certa.
Quando cheguei em casa decidi fazer um faxinão para esquecer que havia dado de cara com a garota de Manaus. No meio da faxina meu celular toca. Era o número da casa de Samir. Achei estranho mas atendi – ele era tão junkie que era bem capaz de estar ligando para me chamar para sairmos ela, ele e eu. Só que dessa vez eu acho que eu não iria. Assim que atendi escutei a voz dele me dizendo: “Olha, só estou ligando para te mandar tomar no cu!” Eu disse “como é que é?” e ele repetiu: “Eu estou ligando para te mandar tomar no cu!” eu perguntei por quê e ele disse que eu havia conseguido o que queria, que eu tinha estragado tudo e que portanto eu tinha que tomar no cu. Eu tentei argumentar, gritei por cima dos gritos dele, mas de nada adiantou, ele tinha dito vá tomar no cu e ele diria vá tomar no cu obstinadamente até o fim. Mas esse não era o fim. Raiva, lágrimas tensas, lágrimas cegas, muita, muita tensão.
Fiquei sabendo depois que a engraçadinha da garota de Manaus esperou que eu saísse e armou um barraco feio na casa dele e ainda por cima menstruou “de raiva”, cagando o final de semana. Ele não tendo em quem descontar, ligou para a única pessoa que parecia ter arruinado tudo e a mandou tomar no rabo.
Eu fiquei triste, primeiro porque ele havia agido daquela forma, segundo porque ele havia ficado com ela mesmo depois do barraco e terceiro porque ele achou realmente que eu tinha ido até a casa dele de caso pensado para marcar território. Só se eu fosse muito otária! Claro que se eu soubesse que a garota de Manaus estava na casa da família dele eu não teria perdido meu tempo indo lá. Fúria, perdição eterna, danação eterna, maldição eterna, roda viva, círculo gigante.
Fiquei cinco longos dias sem noticias do amante. Nunca pude imaginar o quanto um homem inteligente, que escuta as românticas canções de Sade Adu no Youtube de vez em quando à noite, poderia ser tão cruel. Mas é como eu disse anteriormente: esse não era o fim, afinal de contas eu estava lidando com um homem que escutava Sade, mas que assistia the soup, na tv a cabo, e The laeuxtenant no dvd.
O amante era o paradoxo de minha vida. Pensamento antropológico, avesso à antropologia, pensamento de estudar o que passou, pensamento de estudar o que viria e certamente o que viria depois era ele ainda. Buraco negro, buraco grande e negro, poço sem fundo ou de fundura inimaginável, água suja, água de ferrugem e meu corpo desfalecido boiando.
Quando nos falamos, enfim, cinco dias depois, eu estava disposta a dar um ponto final nesse “affair” dos infernos, mas Samir atendeu o telefone e disse “passe aqui hoje”. E não precisa ser gênio para saber que existe uma linha tênue entre o que devia ser feito e o que eu fiz realmente, assim sendo, claro que fui até a casa dele e esqueci de dar um ponto final no tal “affair”. Bosta, bosta grande, bosta rolando solta pelo universo e eu rolando solta no meio da bosta.
Ele havia dito “passe aqui hoje.” e eu, sem pudor algum em ser uma recreação, fui.
Fizemos as pazes, se é que se pode chamar assim esse tipo de relacionamento: carinho vinculado a um barril de pólvora. Por outro lado, Samir fazia com que esse estado não tivesse espaço para cobranças – pelo menos as cobranças consideradas banais. Ele fazia tudo parecer fácil, como na frase “viva e deixe viver”, mas ele esquecia que existiam os problemas entre “o mundo dele” e “o mundo real”. No que dizia respeito ao mundo real, que era o mundo que eu ainda habitava, existiam as interferências externas, e eram essas interferências que tomavam conta de minhas faculdades mentais. Vez por outra justificar, perdoar, absolver, desculpar, desculpar pelo que quer que seja e apertar o nó da corda em torno do pescoço.

Eu me sentia a boneca do poema de Adília Lopes, “uma linda boneca de cera loira, porém sem força”. Seria eu também enterrada em uma sepultura com dois lilases? E o que dizer do sol, que já não brilhava forte havia 7 dias? Será que depois choveria durante muito tempo?
Não. Pelo amor dos meus filhinhos que ainda não nasceram!

sábado, 16 de julho de 2011

VERBO SER


http://www.etudogentemorta.com/2010/12/ser-poeta-e-continuar-divino-verso/

"Que vai ser quando crescer?
Vivem perguntando em redor. Que é ser?
É ter um corpo, um jeito, um nome?
Tenho os três. E sou?
Tenho de mudar quando crescer? Usar outro nome, corpo e jeito?
Ou a gente só principia a ser quando cresce?
É terrível ser? Dói? É bom? É triste?
Ser, pronunciado tão depressa, e cabe tantas coisas?
Repito: Ser, Ser, Ser. Er. R.
Que vou ser quando crescer?
Sou obrigado a? posso escolher?
Não dá para entender. Não vou ser.
Vou crescer assim mesmo.
Sem ser esquecer."

- Drummond.

sábado, 9 de julho de 2011

MaGrace.


"Quando você fôr bem velha
Morando ainda em frente à casa amarela
Junto àquele gato enjoado, andando sempre miando pasmado
Irá ver nossas fotografias e lembrar-se de meus versos
E verá flores nos cantos entre as sombras no quintal
Será capaz de dizer: jamais sem você conseguirei viver
E eu já estarei morto
Mas meu fantasma deitará sobre o seu corpo,
Pois ao escutar meu nome irá logo acordando
Quando você fôr bem velha, à noite."

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Caralho, que bosta.

Dez horas da manhã de domingo – ou seja, madrugada – e lá estava eu, digitando um texto do tamanho de um bonde, quando, de repente, o teclado enlouqueceu. Uma janela com um aviso, que eu não entendi, saltou na tela. Eu, na minha infinita sabedoria, de gente arrogante, dei um enter e pronto: a merda tava feita: desativei a porra do teclado.
Estava quase chorando, pensando em quem diabos poderia me ajudar a inverter a idiotice que eu tinha feito. “Puta merda, hoje é domingo. E agora?” Saí andando à pé, com o computador nas costas. Começou a chover. “Que lindo” eu pensei. Ainda bem que era uma chuva fininha. Bom, fui andando até o restaurante do pai do Pepper – milhões de quilômetros depois. “Ôpa, bom dia, Galileu. Seu filho tá aí?”
Olhei para a cara do Pepper – que por certo não pôde avaliar meu real estado de espírito, visto que eu estava devidamente disfarçando, as lágrimas de desespero, com uns óculos escuros.
  • O que foi? – ele perguntou com o sorriso mais lindo do mundo.
Eu rosnei, sem querer:
  • Eu sei lá que caralho eu fiz – pausa. Depois voz baixa, cheia de vergonha – tá, eu sei: apertei o tecla shift cinco vezes.
  • Ah, isso é simples de resolver.
Pepper Lovitche.
 
Eu esbocei um sorriso de falso alívio e senti meu corpo se derretendo na cadeira onde eu estava. Ele lá, todo tranquilo e eu num misto de pensamentos variando entre um simples “graças a Deus” e um complexo “puta que pariu, como eu sou burra.”
Enfim, após um minuto e meio, fui embora ainda com uma sensação ruim, sem saber se ficava apenas feliz, por não ter feito uma cagada maior, ou triste, por haver descoberto o quão leiga eu ainda sou em assuntos digitais – e, nos dias atuais, ser leiga, burra, idiota, mongol, seja lá o que for é foda.
No caminho para casa, a pé e na chuva fina, novamente, por impulso, parei num brechó e comprei uma calça de algodão cru por R$ 2,00.
Aí sim, como genuíno representante de espécime homo sapiens sapiens do gênero feminino que sou, pude, finalmente, sorrir de alívio. Melhor que isso só com chocolate meio-amargo.