Echo, echo, echo(...)

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

De - des - formado

Na foto: Narayana & Drama Queen.


Chorei por dentro.
Chorei ao dormir.
Encontrei-me num tipo de encurralamento destrutivo por mim mesma construido.
Uma barreira do inferno.
Pensei comigo mesma:
"será que,
já que todos estão juntos,
a errada sou eu?".
Mas em qual aspecto?
qual a minha certeza nisso tudo?
Agora eu sei bem o que eu tirei desta prova toda..
Nem sempre as pessoas se unem por algo apenas em comum (bom ou ruim),
ao longo do caminho alguém vai ter a prova de tudo:
........................................"Valeu a pena?"
Presisamos ser boas pessoas e não tentar magoar ou maltratar ninguém.
Pois isso é feio,
é ruim
e retorna num círculo vicioso nocivíssimo que te atinge como uma rasteira revertido em um bote de cobra cascável.
Eu estava certa.
Tudo pelo que eu passo ,eu mereço - tudo - e preciso ficar calada e aceitar..
no final das contas
é como você lidou com a situação que vai te dizer o que você merece ter de troco.
.........................................Qual foi o seu revide???
.........................................O que você tomou como arma?
.........................................Quantas pessoas conseguiu ferir???
.........................................E seu eu interno como ele se sentiu ferindo ou massacrando, ignorando, desejando um mal por longas gerações???
.........................................Quantas vezes você desejou morrer para que tudo acabasse logo?
.........................................Quantas horas pensando e repensando sobre e querendo saber/poder fazer algo?como fazer isso?onde e quando fazer - o que??????
Todas essas "nada-conclusões" onde não obtive resposta alguma além de me deixar mais confusa
apenas me fizeram enxergar o quanto tenho que pensar antes de qualquer coisa ou mesmo de agir.
Quando tudo foi esclarecido,quando tudo retornou para mim era eu quem estava por cima.
........................................Eu estava certa.
........................................Eu estava certa,não os outros - todo mundo errado.
e depois dormi tranquila ouvindo um ronco baixinho e bem familiar.
Pude obsevar um pouco mais o quanto a vida me reserva surprêsas.
Susprêsas comuns,que a gente quase espreita lá longe.........................
dois palmos de distância
O meu labirinto não termina.
O meu caminho é muito torto mas finda.
Até lá eu vou estar tão atenta quando um coala comendo eucalipto trepado longe do solo com o ventinho nas orelhas e sentindo-se/me livre até o próximo galho........


O mundo sempre esse..
Voltas e voltas e voltas...

Como é bom estar viva!
O estalo parece nunca vir.
O pensamento que te vai trazer paz - aquilo que é sua resposta para tudo.

É sempre depois de muitas lástimas que você nota que merece tudo de ruim que te acontece,
mas que nada é culpa sua - é apenas e sempre o que faz parte de sua natureza humana:
mesquinhar,
apedrejar,
corromper,
julgar.

 (Drama Queen).

Obs.: Texto publicado originalmente em: http://gringosbar.blogspot.com/

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Afinal, de quem é o mundo?




Por sorte eu tenho cruzado com uma galera bacana ultimamente, diferente de minha irmã que me contou uma história bizarra sobre uma vaga de estacionamento.

 Seguinte, tinha um carro saindo de uma vaga no supermercado e um cara na terceira idade estava esperando pacientemente a retirada do primeiro quando, do nada, um terceiro carro surgiu preenchendo o espaço do estacionamento.  




O cara colocou a cabeça para fora da janela enquanto manobrava:

- Aê, vovô, se liga. O mundo é dos espertos.

O “vovô”olhou sério e literalmente enterrou parachoque e parte do capô do próprio carro na traseira do carro que lhe tomou a vaga:

- O mundo é de quem tem dinheiro – foi o que ele disse saindo do carro, batendo a porta e virando de lado para jogar, cheio de cinismo, um cartão de visitas com seus dados – Fale com meu advogado.

Não dá pra saber quem era mais esperto, não é mesmo? Muito menos quem era o mais doido. Vai saber. Eu não vou saber. Não os conheço, nem um, nem outro. E apesar de ter rido, contado a história como se fosse minha, tirado a maior onda, não estou bem convencida de que eu faria como o “vovô” nem de que ficasse sem reação como o otário sem educação fez. O fato é que a história é muito boa de contar, mas com certeza se fosse com alguém que eu conheço talvez não fosse tanto assim. E pensando bem, o final nem é tão essas coisas: saber que o mundo é de quem tem dinheiro me deprime. Isso é cruel. 

                                                Não conheço outro remédio. Só rindo mesmo.


terça-feira, 23 de agosto de 2011

(Sem) saco – cala a boca.

 
Então, lá estava eu tentando escrever algo pertinente para o blog e nada. “Já sei: vou abrir a garrafa de vinho, tinto, seco, de R$ 6,00”. Sentei, bebi, tentei escrever. Nada. Puta merda e agora, José, para onde? Daí vou escrever sobre minha falta de inspiração hoje. É isso. Vou fazer uma coisa que detesto: escrever sobre a minha falta de inspiração – com toda essa desenvoltura que a falta do que escrever trás, tou igual a Raul Seixas: vou rasgar dinheiro e botar fogo nele, só pra variar (se bem que no meu caso, a única parte em que me encaixo é no “só pra variar”, pois rasgar dinheiro e tocar fogo eu não faria, nem se todas as notas de cem estivessem riscadas com frases de macumba). O que tá pegando é que eu tou meio atrapalhada, tentando fazer mil e uma coisa funcionar: abrindo empresa, revisando livro para a revisão profissional, orientando uns conhecidos que estão de bode por causa de uma mina (ou uma amiga por causa de um cara), atendendo aos telefonemas esperados de minha mamãe (que me liga oito vezes por dia) e matando cachorro no grito por causa da “liseira” sem fim que consumiu minhas riquezas nesses últimos meses. Claro que com o mundo girando, eu sei que a empresa vai abrir com força, o livro vai para a revisão, meus amigos encontrarão alguém que os faça felizes et cetera, et cetera, et cetera. Com certeza minha mamãe vai continuar me ligando oito vezes e o dinheiro eu vou recuperar só mais tarde, mas, como já foi dito: o mundo gira e põe tudo em seu lugar. Enquanto isso, desculpem essa bosta de post, senhores.

Um abraço,
Narayana Rios.

Obs.: Tou igual ao menininho da formiguinha: Que dó, que dó! http://www.youtube.com/watch?v=Nq0GP4yQup4&NR=1&feature=fvwp(O problema é que a formiguinha no momento sou euzinha. Rá. E o espelho que me diz: chupa essa manga.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

VARIAÇÕES




Quando a lua tornou-se minguante, ouvi apaixonados suspirando.
Meu coração é um turbilhão de violentas emoções.
Meu coração é a solidão no bar que acabou de abrir.
Vejo a morena alta e gorda que se aproxima e deixo que ela coloque a mão sobre a minha.
Ela se debruça bêbada e bebe meu único copo de água-ardente.
Ela foi a perdição da minha vida desde aquele instante: gerava um filho que não era meu.
Pedi que o único garçom colocasse uma música triste e, com a mesma tristeza, levei minha perdição ao banheiro, para que algo de mim estivesse no filho.
Saí tropego: "Meu Deus, não sou muito forte."
Meu coração gemia um único verso aranhado e desnecessário.
O dia raiou e eu fui para a casa onde poderia dormir com a loirinha, que já me esperava morna em cima da cama.

- Salvador Rios.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Momento ìntimo



Encostei minha cabeça em seu peito como forma de terapia.

Fiquei lá todo indefeso, incapaz de impedir o que você queria fazer, tendo de agüentar você sendo má – eu sei que você sabe como fazer isso.

Então adormeci e tive um sonho parecido com o de Jacó: anjos andando por uma rampa nas duas direções, descendo do céu e subindo até ele.

Quando acordei minha cabeça já não estava em seu peito, nem você estava mais lá. Seria possível negociar com Deus?

“E para que serve a alma se não a puderes negociar?”- era o que tinha lido num daqueles livros silenciosos que me encaravam diariamente.

E aí se formou um estranho alarido dentro de mim e eu quis te telefonar para saber como estava, o que me foi assustadoramente estranho

já que nunca me importei realmente com isso.

Eu liguei, mas ninguém atendeu.

Então eu virei para o lado e dormi. Decerto amanhã tudo estará bem.




-Salvador Rios*, 2005.
Texto publicado originalmente em: 27 de novembro de 2009

 

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

A Amiga


Outro dia eu estava com Samir num barzinho legal, quando uma amiga apareceu. Fazia muito tempo que eu não via Micheline. Ela era uma dessas mulatas de arrasar quarteirão, mas não tinha um pingo de juízo, era doidinha, doidinha. Chamei para sentar junto conosco, não só por educação, claro.
Ela estava ainda mais bonita do que a lembrança que eu guardava dela na memória: cabelos longos, lisos e negros tais quais os cabelos de Iracema, que aliás tivesse sido criada nos tempos atuais, Iracema seria totalmente inspirada em Micheline. E ela era alta e tinha um corpo bonito. Seu sorriso era branco e contrastava com a pele morena lisinha. Eu disse “e aí, menina, o que anda fazendo da vida?” e a danada me respondeu depois de dez segundos de silêncio “virei puta!” Enquanto eu quase engasguei com a cerveja, o palhaço do Samir caiu na gargalhada. Eu disse “como assim, sua doida?! Tá de onda com a minha cara, não é?” Mas aí ela sustentou o que havia acabado de dizer, e o bosta do Samir, que estava se borrando de rir, arregalando os olhos verdes de vez em quando, começou a me pedir, com apertões no ombro, que eu colocasse a vadia na mão dele. Vejam só! Era só o que me faltava: uma amiga vadia e um amante cachorro! Surpresa, paciência, discrição, suspiro, longo gole de cerveja.
Passado o baque inicial, comecei uma conversa com uma pergunta:
  • Micheline, como é que foi isso?
  • Ah, menina. É uma longa história(...)
  • Mas conta que eu estou louca para saber. Você não ia terminar a faculdade de Turismo?
  • Larguei depois que comecei essa nova empreitada: agora faço Direito. Assim que me formar monto um escritório, ou então viro escritora de best seller como já vi umas colegas de profissão fazerem por aí.
  • Sei. - pausa - Mas, e aí, vai contar ou não como foi isso?
Riso, riso nervoso, constrangimento ante o amante. Sinalizo dizendo que ele provavelmente não lembraria de porra nenhuma no outro dia: ele era muito porra louca para isso. Ela pareceu confiar no que eu disse – não poderia ser de outra forma afinal, era a mais pura verdade: ele não lembraria de nada no outro dia, porém quando estivesse na secura e de saco cheio de mim com certeza ele perguntaria por ela.
Micheline começou então o relato detalhado de como havia se tornado uma “mulher da vida fácil”, seja lá o que essa expressão quer dizer. Ela disse “lembra daquele meu amigo que tinha uma tara filha da mãe em mim, o Michael? Pois é, um dia estava tomando vodca com ele numa boate e ele do nada me passou uma proposta: ele queria chupar meus peitos e pagaria o preço que eu escolhesse por isso.”
Aí Micheline contou que não respondeu nada, que olhou para Michael pediu licença e foi ao banheiro. Quando ela voltou, pensando que ele mudaria de assunto, ele disse “muito bem, Micheline, eu te pago 300,00 reais para que você me deixe chupar seus peitos por meia hora!” Ela disse que não teve como recusar, mas não aceitou logo de cara, e como ela fez jogo duro do tipo “mas o que é isso, cara! Nós somos amigos!”e Michael percebeu que faltava muito pouco para que ela aceitasse a oferta, ele deu uma incrementada na proposta: “eu pago os 300 e mais o nosso consumo durante a noite! Depois ainda te dou um bônus!” Micheline engolia a última dose de vodca, enquanto Michael já pedia a conta para o garçom. Paralisia, goto, olhares nervosos, nervosismo de ambos.
Pegaram um táxi e foram parar numa suíte temática de um quarto de motel de luxo. Ela disse que lembrou de haver pensado “como é que pode, um cara já nessa idade – 41, agindo como garoto! Seria Michael um louco? Claro! Era isso: ele era um louco!” Mas então o que ela seria? Ela ligou o ar-condicionado, mesmo detestando frio, e pediu que ele lhe servisse uma bebida, pois estava ainda sem acreditar no que estavam fazendo. Ela virou uma latinha de cerveja e pediu mais uma. Ele pegou para ela, e como num rompante de cavalheirismo, esqueceu a tara nela e disse que se ela não estivesse à vontade eles poderiam ir embora. Micheline disse que tirou a blusa bem rápido nessa hora, afinal 300,00 reais são 300,00 reais, e tirou o sutiã devagar de costas para ele, que se não estava babando ainda era única e exclusivamente porque era isso que o separava de um garoto: experiência. Minha nossa o que aconteceria? Praticidade, bebedeira, exclusividade recém conquistada, saciedade momentânea, pedidos convenientes.
Quando Micheline se virou poderia jurar que ele voaria em cima dela, mas ao contrário, ele apenas sorriu com o olhar petrificado admirando seus seios morenos, seu colo perfeito e já não tão jovem, embora não aparentasse ainda sua real idade. Michael pediu que ela se aproximasse dele, e com calma, pegou os seios dela com ambas as mãos, falou com eles, acariciou muito, e depois dedicou-se a arte de sugá-los. O mais incrível é que ele, o tarado dos seios, chupava com delicadeza e quando era mais intenso, mesmo assim, não a machucava. Será que ela estaria bêbada e por isso não conseguia sentir as coisas direito? Será que ele, o maníaco guloso, tinha a técnica mais perfeita de como se chupar uma mulher - como um filho que mamasse tranquilamente? Perguntas, dúvidas, dívidas, preços, fantasia e ônus.
Micheline disse que ele ficou sugando seus seios durante a meia hora que haviam “combinado”, nem mais nem menos. Ele era um homem de palavra então. Se bem que no embalo ele havia pedido um beijo na boca que ela recusou dar, ainda me confessou, mas um beijo era o de menos diante do que já acontecia, não é? Assim penso eu. Vai ver que ela não.
Eu escutava a história com interesse total. Samir, o meu amante, assistia um jogo de futebol que estava sendo transmitido na tv do bar. Micheline ainda disse que Michael apertava seus seios com as mãos e ficava falando com eles frases do tipo “por que vocês são tão bonitos? Por que parecem ter 17 anos?” ela disse que ficou rindo disso depois, na hora só pensava na grana e como as coisas tinham chegado nesse ponto parecia já não importar mais. Ele, o fascinado quarentão, tinha encerrado a diversão dizendo que “existe o ônus e o bônus. O bônus é o que fica.” Como eu não entendi essa última parte, ela me esclareceu dizendo que ele ao dizer “o bônus é o que fica” fez um gesto como quem está se masturbando. Eu disse “ah, tá.” Súbita compreensão, pernas descruzadas, aceno com a cabeça para o amante.
Ainda soube que eles, o tarado e a futura puta, foram embora no mesmo táxi em que entraram no motel.
A tarde passou logo enquanto eu escutei umas outras duas histórias de Micheline. Mulher mais doida que eu conhecia, talvez única puta confessa que eu conhecia. Samir e eu nos despedimos dela e fomos embora.
Ontem eu brinquei dizendo que iria chamá-la para tomar uma birita e Samir disse para deixar quieto. Perguntei “por quê?” e logo ele, que é o mestre de ficar afim das minhas amigas, disse a seguinte frase: “Não vale à pena, ela não é ouro, é apenas Micheline.”
Pois é, vai entender.


terça-feira, 2 de agosto de 2011

Quando o Conceito de Bem-estar é Enganar


Fui caminhando entediada pelas ruas do centro da cidade. O calor era insuportável e meu carro, que eu tinha comprado há apenas cinco meses, tinha sido roubado. Saco. Precisava pagar umas contas, fazer umas compras para o jantar, ir à manicure(...) e tudo à pé. Agilidade, cansaço, tédio, masmorra e guilhotina.
O amante com certeza estava me esperando em sua casa já com algo pronto para comermos. Ele cozinhava muito bem – habilidade que havia conquistado trabalhando numa cozinha enquanto morou na gringolândia.
Samir era espirituoso e engraçado, mas mais que isso: ele era um folgado: esperava que EU ligasse, que EU perguntasse se estava tudo bem. - Ao menos ele lavava a louça e era organizado, quando me mudei da casa de minha mãe eu já sabia disso.
Samir e eu já estávamos juntos há dois anos, sete meses e quinze dias. Nem sei como isso aconteceu. E por não saber, havia acreditado na história dele de que eramos amigos de um arraiá qualquer, embora não fizesse o menor sentido para mim, era a única coisa que me vinha na cabeça quando questionada sobre o início do romance. Então era essa a resposta que eu dava: “Sim, ele é um amigo que conheci num arraiá sei lá quando e levei para casa.” Inconsequente, afogueada, débil.
Minha mãe me perguntou se eu não poderia namora-lo ao invés de me mudar para morar junto. Respondi que não, e mesmo sem entender ainda hoje o porquê de eu haver me mudado num espaço de tempo tão curto – seis meses – fui de mala e cuia morar no flat dele.
O cara era um veterano do rock e era trilíngue: falava inglês, francês, português (que também chamo de brasiliês), vivia de pensão, era louco, não tocava, nem escrevia, seus gestos eram duros e às vezes gritava quando falava. Nesse sentido, o que quer que eu pudesse dizer em seu favor seria invenção minha para tentar suavizar o fato de ele ser um completo junkie. Eu dizia “Samir, meu bem, vamos tentar produzir algo bacana, pôxa, você é um cara tão inteligente. Tenho certeza que deve poder fazer algo legal, ou pelo menos tentar.”
  • Claro. Por que não? Amanhã vemos isso.
Então eu olhava impaciente para ele e me sentia forte, correta, inacessível, uma mulher fantástica convivendo com um homem franco, porém incapaz de gestos sensíveis, mas que podia me sustentar apesar de tudo. - às vezes eu me questionava se isso seria suficiente. Será que era apenas isso que eu merecia? Você sabe a resposta, leitor? Eu sei a resposta: eu mereço o que estiver disposta a merecer. Sei disso tanto quanto sei quem sou. Fortaleza, muro branco, decisão (ou a falta dela) e comportamento lascivo.
Uma vez, quando ainda não morávamos juntos, o pai dele havia emprestado o próprio carro, que não era lá essas coisas, mas servia para não se andar à pé. Samir poderia me pegar em casa e devolver o carro depois de uma hora, uma hora e meia. O que é que ele faz após me buscar? Pára no primeiro bar que vê e se faz de doido. Eu disse: “cara, e se seu pai precisar do carro?” no que ele diz: “Empresta seu celular para ligar para ele então.” Samir nem celular tinha, ai de mim. Eu disse: “Pega, liga logo.” Ele ligou, falou com o pai, e depois que desligou olhou com uma cara de demoninho que só ele tem, e disse que antes de sair da casa do pai ele tinha pego as chaves do carro da irmã e colocado no bolso. Perguntei o por quê, ele disse “adivinha”(...) a irmã dele tinha acabado de fazer uma viagem para a França e deixou o carro no estacionamento do condomínio onde morava e as chaves do carro com o pai deles.
  • Nós vamos lá no condomínio da minha irmã, eu falo com o porteiro, pegamos o carro dela, você vai levando esse carro do meu pai e eu levo o outro, deixamos a Parati num lugar estratégico para que meu pai não veja, devolvemos o carro dele e vamos curtir na Parati da minha irmã!
  • Samir, você definitivamente não bate bem da cabeça! Tá vendo que eu não vou fazer isso com seu pai! E se sua mãe descobre? Não. Eu gosto muito dela e ela me odiaria se descobrisse.
  • Porra, Gabi! Você desse jeito cai no meu conceito! O que é que custa sair um pouco? Vamos, vai dar tudo certo.
Eu retruquei, retruquei, mas após vinte minutos e duas cervejas acompanhadas de um “migué” daqueles eu o estava seguindo no carro do pai enquanto ele guiava o da irmã ruas à fora.
Fomos à casa do pai dele, entregamos o carro e batemos em retirada até onde tínhamos estacionado a Parati para completar o restante da missão. Samir olhou para mim e disse “onde estão as chaves do carro?” eu disse “que chaves?” Ele ficou branco. “Gabi, eu dei as chaves do carro nas suas mãos. Onde é que elas estão?” Aí eu lembrei: as chaves da Parati estavam dentro do carro do pai dele, puta merda! Que situação. Samir começou a dizer que eu era a rainha do vacilo e ainda fez uma dancinha ridícula dizendo que era a dança de premiação do “nobel do vacilo”. Eu sem graça concordei. - Fazer o quê, não é? Tinha vacilado mesmo. Vacilado feio.
Voltamos para a casa da família dele e só para aumentar o nosso drama a mãe de Samir disse que o pai dele havia acabado de sair. “Fodeu! O coroa vai ver as chaves do carro da minha irmã e vai se ligar na minha estratégia.” Esperamos com um sorriso nervoso nos lábios. Samir me encheu o saco. Eu fiquei totalmente envergonhada. Compramos mais umas cervejas no boteco da esquina. Eu disse que ele tivesse calma, pois as coisas ainda poderiam dar certo. E deram: o pai dele, que tinha apenas ido dar uma caminhada na praia voltou, e, melhor ainda, não tinha notado as chaves da Parati bem em cima do banco do carona do próprio carro.
Passeamos muito, devolvemos o carro da irmã intacto ao condomínio, voltamos à pé para casa e ninguém nos pegou. Frio na barriga, corda bamba, suor, suor na testa latejando, sorte e sorte por tudo que fôr.
No dia seguinte Samir quis repetir a mesma operação. Dessa vez eu sequer contestei. Mas aí foi a vez DELE pisar na bola: imaginem vocês que dessa vez foi Samir quem deixou as chaves da Parati dentro do carro do pai dele. Ah, eu não me aguentei: fiz a mesma dancinha ridícula de repasse do “nobel do vacilo” para ele. Dessa vez não teríamos como fugir: seríamos pegos, com certeza. Ele disse que o pai dele sabia dar esporro como ninguém e que se ele fosse mais novo ou mais franzino com certeza levaria uma surra.
Eu disse “tenha calma que ainda há uma possibilidade de ele não ver as chaves. Já não tinha acontecido uma vez?” e Samir foi me deixar no ponto do ônibus. Eu morrendo de rir, ele, coitado, cabisbaixo. Aí começou a me dar pena dele, querendo ou não, ele já era um cara muito legal para mim. Deveria ficar com ele até que o coroa chegasse? Bom, eu tinha de ir para casa, por mais que a situação pedisse que eu ficasse. Ele disse “amanhã a gente se vê” eu disse “será?” Ventania, altura, ascensão, sensação de queda, espera e mais espera.
Cheguei em casa e fui ler um livro. Nem consegui me concentrar. Será que o amante iria se ferrar muito? Liguei a televisão. Interessei-me por um filme francês na tv a cabo.
Quando eu já estava quase dormindo meu celular tocou. Era o número da casa dos pais de Samir. Eu pensei “ coitado já está me ligando. Deve ter levado uma lição de moral daquelas.”
  • Oi, Samir.
  • Oi, Gabi. Se arruma que eu estou passando aí para te pegar para sair. Meu pai não viu as chaves do carro da minha irmã de novo, você acredita?
Então é isso. Dizem que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar. E eu digo que não é bom confiar nesse ditado, não.