Na foto: poema de CivoneMedeiros Click: FotoLumina |
Gustav
Flaubert, escritor francês (1821-1880), apesar de absolvido no processo que lhe
moveram há 160 anos por conta de sua Madame
Bovary, mesmo ainda hoje, se fosse vivo, certamente escutaria coisas do
tipo “Não gosto de Madame Bovary. Emma é
uma mulher muito depravada” - como outro dia escutei de uma amiga, num
clássico modelo metonímico de apreciação.
Como
um bom advogado - que não sou - defendi Emma Bovary, destacando justamente suas
falhas de caráter como algo genial na obra de Flaubert, dizendo a essa minha
amiga “Mas a grande literatura é aquela que
mais se aproxima do humano...” .
Foi Miguel de Cervantes (se não o primeiro,
certamente o mais conhecido) que “esculhambou” com a figura boçal do herói
virtuoso, dando-lhe um ar patético e sonhador. Iniciando o que passou a se
chamar de literatura moderna, somente
muito tempo depois.
Digo
muito tempo depois porque até a
chegada da desconfiança, do ciúme, da inveja, da dissimulação às letras, foram
quase dois séculos- do bufão Dom
Quixote ao parricida Smerdiakóv.
Como
numa sopa primordial[1],
acontecimentos dramáticos dentro da história humana (como guerras, as grandes
descobertas científicas ou revoluções tecnológicas) sempre levam a algum tipo
de reflexão; criando a condição para a dúvida, a angústia, ou o simples
questionamento pelo lugar do homem no mundo. (O que me leva a pensar, em dias
como os nossos, “Oh, poetas do amanhã, grandes escritores, ergam-se”! O futuro
é aqui!).
O
final do século XIX pareceu viver uma nova espécie de renascimento- E que século de mãos![2]
- Dostoiévsky, Machado de Assis, Eça de Queiroz, Zolá, Strindberg, Stendal
(para ficarmos só aqui...)
Essa
tendência de desmitificação dos valores - desde o realismo - veio se consolidar finalmente nos escritores do
pós-guerra (No caso, nas duas guerras do início do século XX), nos movimentos
europeus de vanguarda e na psicanálise. No entanto, foi curiosamente na “Arte moderna”, e hoje em dia nos
fenômenos de cultura pop, que houve uma inversão no epíteto.
Os
deuses, na antiguidade, se portavam muitas vezes como mortais em suas ações
mundanas. Tinham raiva, inveja. Possuíam diversos amantes. E mesmo assim, nunca
deixavam de serem deuses. Hoje, os
heróis, quando assumem a sua porção humana, são considerados anti-heróis, como o Deadpool ou o Wolverine.
E
ao contar com o termômetro de popularidade desse velho-novo gênero demasiado humano, lotando salas de
cinema, em detrimento de tipos como o do super-homem (aquele modelo de
perfeição que veio lá de outro planeta, inalcançável sobre as alturas... como
sonhava Friedrich Nietzsche...), onde a narrativa de uma trama possa se
iniciar- por exemplo- a partir de um tiro na bunda[3],
muitos já devem estar até por aí dizendo: deus
deve estar mesmo morto.
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