Echo, echo, echo(...)

quinta-feira, 4 de março de 2010

Rito


Gabriela entrou no salão e cortou os cabelos bem curtos sem medo. À tarde a gata saiu para caçar. Olhou para o rapazote que vinha em sua direção: despojado demais. Esbarrou no quarentão: sério demais. Andou pelas ruas até cansar e nada.
Como era possível, afinal, que já estivesse tão atrasada para o rito de final de semana? Estava se retirando para casa quando sentiu um olhar em seu pescoço. O olhar era tão intenso que fez com que se virasse.
Lá estava sua diversão de fim de semana: uma gata com cara de dondoca e um homem de meia idade com cara de intelectual.
Estavam olhando para ela já fazia um tempo de dentro do carro. Gabriela foi até eles passou pelo motorista, deu a volta e parou ao lado da garota, apoiando os braços na borda da porta, sorriu sem lhes mostrar os dentes.
A mulher estava com os lábios num meio sorriso e isso era um bom sinal para Gabriela, que achava que uma boca assim, entreaberta, era um aviso de que a cama compartilhada com essa pessoa devia ser bastante intensa. Não resistiu e deu um beijo naquela boca de lábios finos e bem pintados. A mulher correspondeu. O homem com ar de intelectual apenas observava a cena com ar parcialmente sério.
Foram parar num apartamento.
O homem serviu drinques e colocou música para tocar. Olhou para Gabriela e disse que ela se parecia com todo mundo.
Ela não ligou. Dançou sensualmente com a mulher e trocou insinuações mudas ao fim da dança.
Sentaram-se: Gabriela ao lado direito do homem e a mulher, por impulso, deixou-se cair no colo dele. O sofá era macio. Beijaram-se triplamente. Estavam concentrados em suas línguas e respirações. Começaram a se esfregar pausadamente e com força, depois aumentaram o ritmo, até que o tecido de suas roupas estivesse insuportavelmente quente.
Gabriela levantou-se, tirou a mulher do colo do homem e a pôs de lado, abriu as calças dele e segurou-lhe o pênis com cuidado levando-o à boca. A mulher despiu as calças de Gabriela por trás e pôs-se a lambê-la devagar e com maciez.
O homem estava encantado - talvez já não achasse Gabriela igual a todo mundo.
Os três fizeram amor durante pouco tempo, porém exploraram-se ao máximo, como se amassem um ao outro intimamente e para sempre.
Depois o homem pagou a mulher com cara de dondoca e em seguida pediu o número do telefone de Gabriela.
Ela não deu.

E lá se foi Gabriela com o cheiro do cravo e a cor da canela.
Passou na casa de sua mãe e pegou seu filho de pai desconhecido, concebido numa época em que as doenças pareciam não ser temidas, e rumou para casa suspirando felicidade por mais um ritual de fim de semana cumprido.

- Justine Febril.

Obs.: “(...) E lá se foi Gabriela com o cheiro do cravo e a cor da canela. (...)”
Alusão no texto à “Gabriela, Cravo e Canela” do saudoso Jorge Amado.
Obs2.: Na foto, cena de Coração Iluminado - Hector Babenco.

4 comentários:

  1. Pois é...ninguém é igual a todo mundo. Quando isso acontece fatalmente é um filho da mediocridade.

    =**

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  2. Mas, talvez se sendo igual se escape ao julgo do criador(...)* Talvez.

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  3. Febril, novamente adorei o texto. Escritos de uma sensualidade maravilhosa. Posso te pedir uma coisa? Vc não precisa de obs ou * dando maiores esclarecimentos. Ta tudo mais que claro e bem escrito. Essa coisa de obs e * é coisa de idiotas acadêmicos como eu. Bjão.

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  4. Obrigada pelo carinho e pela observação. Infelizmente não concordo que essas manias acadêmicas são tão idiotas. Bom, talvez eu consiga explicar melhor depois.

    Abraço,
    N.

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